Nu (1993)

Escrito por Filipe Manuel Neto el 17 de diciembre de 2023

Desagradável e incómodo, muitas vezes altamente apreciado pela crítica, está esquecido pelo grande público… compreensivelmente.

O director Mike Leigh dirige com habilidade e inteligência um filme que está longe de agradar a todos e que não se importa de ser incómodo: conta-nos a história de um homem que se esconde em casa de uma antiga namorada para fugir a um processo por violação, e que iremos acompanhar por várias peripécias e diálogos que oscilam entre o niilismo, o “non-sense” e o profundamente filosófico. É um homem desagradável, com toques algo sádicos, mas o filme está cheio de personagens desagradáveis numa história sombria. O filme fez considerável sucesso entre a crítica, arrecadou prémios de vulto em Cannes e a nomeação ao BAFTA, mas é um daqueles filmes tão filosóficos e perversos que consigo entender por que razão está tão esquecido.

O grande ponto forte do filme, para mim, é a enorme actuação de David Thewlis, um dos mais competentes e consistentes actores britânicos, um veterano com uma carreira digna de causar inveja e que já tem brilhado numa multiplicidade de projectos, mas que não tem sido particularmente notado ou estimado como merece. Não ouso dizer que este é o seu melhor filme, mas está claramente nos cinco melhores que ele já fez. O restante elenco, no qual podemos destacar pela positiva os esforços de Lesley Sharp e Greg Cruttwell, é bastante menos interessante, mas consegue dar-nos bons momentos e boas personagens.

Tecnicamente, o filme apresenta uma cinematografia muito bem trabalhada, que enfatiza as sombras, a meia-luz, a luminosidade indirecta. Isto não podia ser mais adequado para o ambiente que o director quis criar, e acaba por ser o grande ponto de honra técnico: os cenários e figurinos são bem feitos, mas sem notas de mérito, e os efeitos e banda sonora são tão discretos que se limitam ao essencial.

Movendo-se num ambiente sombrio, enevoado e denso do submundo de Londres, não há aqui nada de particularmente simpático, alegre ou florido. Há um esforço para expor com certa crueza a nudez moral e as fragilidades sombrias de cada personagem. Pelo meio, há diversas cenas de sexo e de nudez, incluindo um nu frontal explícito do protagonista. No entanto, não há aqui qualquer intenção de beleza, de sensualidade ou de erotismo. Esta é uma nudez grotesca, feia e torpe, que nos incomoda. Não é, por isso, um filme que pense rever algum dia ou que possa dizer que me agradou, ainda que lhe reconheça os méritos e notas de qualidade.