Casamento Sangrento (2019)

Escrita por Filipe Manuel Neto em 12 dezembro 2023

A maldade do dinheiro, uma carnificina brutal e um casamento por amor num filme de altos e baixos.

Quantas vezes nós, comuns contribuintes, não pensamos no hipotético lado sombrio que nos agradaria existir naquelas famílias ricas do meio empresarial, da política e das artes? Para muitas pessoas, a inveja é algo muito natural. Outras, como eu, preocupam-se mais com a origem lícita das fortunas do que com qualquer outra questão (o que me importa é que os ricos ganhem honestamente o seu dinheiro, o resto sinto que não me diz respeito) e outras pensam que, sendo o dinheiro algo tão terreno e eventualmente maléfico, todas as grandes fortunas têm alguma dose de perversidade. Ao contrário de pessoas como eu, que encaro o dinheiro como uma ferramenta que pode ser bem ou mal usada, há imensa gente que associa ao dinheiro essa carga malévola.

Este filme começa por aí e cria em torno de uma família abastada toda uma história de satanismo, carnificina e ausência de escrúpulos. Tudo se passa no dia do casamento que o filho primogénito do patriarca resolveu à revelia da família. A jovem noiva, para que a família a aceite, terá de jogar um misterioso jogo tradicional que todos eles têm de jogar num dado momento. Um ritual de iniciação maluco numa sala de caça cheia de armas e de animais embalsamados. O que se segue é a previsível carnificina. E eu digo que isto é previsível porque o filme é estupidamente fácil de adivinhar, sendo esse o ponto fraco de todo o enredo. Como filme de terror, só funcionará para os que tiverem estômago fraco para cenas sangrentas: sim, o filme tem bastante gore, mas já vi coisas piores.

Tecnicamente, o filme tem os seus altos e baixos. Aproveitando muito bem os locais que a produção conseguiu para filmar no Canadá, incluindo uma mansão-museu famosa, os cenários e figurinos são excelentes e dignos de uma produção bastante mais cara. Não é um filme de baixo orçamento, nota-se que a produtora investiu no projecto, mas não me parece que seja propriamente a primeira aposta para uma temporada de cinema: efeitos visuais e sonoros convincentes e eficazes ajudam bastante e a edição foi bem executada. A banda sonora tem os seus momentos espirituosos, mas em contraste a cinematografia é excessivamente tremida e, ocasionalmente, mal enquadrada.

Com apostas tão aparentemente pesadas, foi uma pena sentir que a produção foi buscar um elenco de terceiro escalão para o projecto. Os protagonistas não são maus, mas falta-lhes a experiência de projectos de primeira água com colegas mais calejados: Samara Weaving fez uma personagem secundária em “Três Cartazes…”, Mark O’Brian foi fazer outra em “Arrival” e Adam Brody participou em “Sr. e Sra. Smith”, mas é só. São actores a competir pelo seu espaço ao sol, um desejo lícito, mas sem experiência e ainda um pouco crus. Em abono da verdade, o filme também não lhes dá personagens desafiantes ou situações complexas. A melhor actriz aqui é Andie MacDowell, mas está longe de mostrar as qualidades que vimos nos seus trabalhos mais antigos. O canadiano Henry Czerny faz o que pode e é notável, mas não pode salvar o filme sozinho.