A Vingança de Manon (1986)

Skrevet av Filipe Manuel Neto den 19 Juni 2023

A outra metade de “Jean de Florette” é a chave de ouro que fecha em beleza uma grande obra do cinema francês.

Este filme é a continuação de “Jean de Florette” e foi filmado imediatamente a seguir a esse filme, com o mesmo elenco, o mesmo director, a mesma equipa técnica, os mesmos cenários e ambientes. Na prática, são dois filmes que se unem como duas faces de uma mesma moeda e para entender este filme é imprescindível ver o primeiro. O roteiro pega na história onde o primeiro a interrompe: a morte de Jean e a passagem da propriedade para os dois Soubeyran. Enquanto a viúva volta à carreira como cantora lírica, a filha de tenra idade fica para trás, torna-se uma pastora de cabras e faz-se uma mulher tão bela que, anos mais tarde, deixa Ugolin Soubeyran totalmente louco por ela. Por casualidade, ela irá encontrar a forma de se vingar dele, do pérfido César e de toda aquela aldeia, que desprezou o seu pai e onde todos, pelo silêncio, contribuíram para a morte dele.

Há muito boa gente que diz que este filme é um daqueles raros exemplos onde a sequela é ainda melhor do que o filme original. Eu aprecio e respeito quem pensa assim, mas se me permitem ser sincero, não estou muito de acordo com essas opiniões. Para mim, este filme é tão indissociável do primeiro que não chega a ser uma sequela: é um só filme de longa duração que foi lançado em duas metades. E honestamente não senti que fosse tão bom quanto o primeiro filme: na minha opinião, são absolutamente equivalentes. Sobre o roteiro, que é excelente, só tenho uma nota negativa a fazer, que é esta: não sou capaz de compreender como a mãe de Manon deixou a filha para trás sendo pré-adolescente, como era no filme inicial. É um ponto que ficou no ar, que não fica bem explicado.

Este filme tem o mesmo núcleo de elenco de “Jean de Florette”, salvas certas pequenas mudanças que tinham de acontecer devido à entrada e saída de personagens. O foco das nossas atenções é a lindíssima e talentosa Emmanuelle Béart, no viço da sua juventude. O trabalho dela foi determinante neste filme: ela transforma a sua personagem numa resistente, numa sobrevivente mais do que numa vítima. Por seu lado, Daniel Auteuil é crível, autêntico e intenso, dando-nos aqui, talvez, o maior trabalho da sua carreira. Yves Montand é brilhante no seu papel, e é muito interessante ver a maneira como o actor foi evidenciando, na sua personagem, a passagem dos anos e das mágoas, tornando-se cada vez mais frágil e aparentemente doente. Claude Berri continua a assegurar uma direcção sólida e inteligente.

O filme tem uma boa cinematografia que transforma a Provença num lugar idílico, onde a beleza natural é quase uma personagem em si mesma. A paisagem rude, com rochas e colinas acentuadas, acentua as asperezas da vida rural e as dificuldades dos lavradores para tirarem o sustento daquela terra. Diferente do filme inicial, onde a inconstância do clima foi um dos temas mais focados, este filme centra-se no amor (há um triângulo que surge a certa altura e amores do passado com muitas consequências) e na vingança da jovem pastora. O filme mostra Béart numa cena de nudez explícita, sem subterfúgios ou rodeios, a única cena onde os pais podem sentir a necessidade de tapar os olhos dos seus filhos (acho que algumas esposas também vão tapar os olhos aos seus maridos). Quanto à banda sonora, é bastante sugestiva e atmosférica.