Ainda Estou Aqui (2022)

Written by Filipe Manuel Neto on September 3, 2022

Um filme muito bem feito, em que a maior falha é tentar tornar eterno um amor de adolescência.

O que acontece após morrermos é um dos mistérios que preocupa a raça humana desde sempre e que continua sem solução. Claro, assim irá continuar porque a busca incessante do Homem por mais conhecimento está condenada a embater em limites intransponíveis, barreiras que não conseguimos penetrar. Isto é, apesar da sua vontade, não é suposto que o Homem saiba tudo. No entanto, a fé tem proposto vais respostas à questão da morte, e não existe, penso eu, uma única religião que não defenda a existência de vida após o momento em que o coração pára de bater. O que varia é o que cada religião e sistema de crenças propõe para essa existência, e a forma como procura advogar essa proposta.

Não sabemos qual a religião em que acreditavam Tessa e Skylar, as duas personagens principais do filme, o qual nunca toca, em momento algum, em questões de fé ou religião. Só sabemos da história de amor adolescente que ambos vivem, durante um curtíssimo período que acaba subitamente, quando ambos sofrem um acidente, ele morre e ela fica muito ferida. Nos tempos seguintes, ela começa a notar coisas estranhas, que a levam a acreditar que o falecido namorado está a tentar comunicar com ela. O roteiro é bom, a história é simpática e observamos rapidamente uma forte influência do filme Ghost neste trabalho cinematográfico, e boa parte da história decorre em flashback, mas é relativamente fácil para nós perceber quando começam e quando terminam.

Todavia, e apesar das qualidades, temos de reconhecer que o filme não traz nada de novo e que há muitos momentos excessivamente açucarados, em que o romance é servido com excessivas doses de doçura e pieguice, normais num casal adolescente, mas profundamente irritantes para a mentalidade de pessoas mais adultas e maduras. Convenhamos, foi um namoro de Verão! Não foi, quase com certeza, o grande amor da vida de Tessa. Não conheço assim tantos casais que se tenham conhecido na adolescência e permanecido juntos para toda (ou quase toda) a vida. É algo que simplesmente não acontece com regularidade, e é difícil para nós, por mais dolorosa e traumática que seja a situação para a jovem rapariga, que a perda dela seja equiparável a uma mãe que perde um filho, ou um filho que perde a sua mãe, ou algo assim. E o sobrenatural e a existência de espíritos ou “fantasmas” não faz sentido para todas as pessoas, mesmo quando as suas crenças de fé admitem a existência deles.

Os protagonistas do filme são Kyle Allen e Joey King, dois actores extremamente jovens e que ainda têm muito percurso pela frente, se desejarem manter activas as suas carreiras no mundo do cinema e da televisão. Não posso dizer que eles não estiveram bem… de facto, considerando a sua juventude, ambos parecem ter feito um trabalho muito satisfatório, especialmente King, que tem mais tempo de tela, melhor material e mais experiência como actriz. A química entre os dois também é boa, funciona bastante bem e dá alguma credibilidade ao romance deles. Há, porém, qualquer coisa que falta, uma faísca de intensidade e de maturidade.

Tecnicamente, o filme aposta de modo consistente no CGI e nos efeitos especiais digitais e feitos por computador. É algo cada vez mais comum, e tratando de um filme com tema sobrenatural, era difícil fugir-lhe e evitar despender uma boa soma de dinheiro em bons efeitos. Gostei deles, no geral, especialmente o efeito na estática da TV, o espelho que se quebra e o "slow motion" que se segue (e que me fez lembrar Matrix com as balas). A nuvem azulada que segue o carro e que o passa a comandar, a partir de certo momento, pareceu-me cliché e exagerada. O filme usa uma cinematografia bastante regular, mas bem executada, com boas cores e boa luz, e a edição foi bem feita, imprime ao filme um ritmo muito seguro e agradável. Os locais usados para a filmagem, os cenários e os figurinos são os previsíveis, e a banda sonora não é memorável.